O
Dia em Que o Tesla Atingiu o Bule de Russell
(Crónica
quase metafísica sobre colisões absurdas e certezas estéticas)
Era uma noite clara no vácuo infinito. As estrelas piscavam como
quem guarda segredos.
E lá flutuava o Bule de Russell,
vagamente britânico, vagamente teimoso, vagamente irónico — como
convém a qualquer conceito inventado para ilustrar o ónus da prova.
“Se alguém disser que há um bule de porcelana a orbitar entre Marte e a Terra, demasiado pequeno para ser detectado, como provar que não está lá?”
Assim perguntou Bertrand Russell.
E assim nasceu o bule.
Simbólico, silencioso, improvável.
Mas eterno.
Do outro lado do cosmos vinha o Tesla.
O Tesla de Elon Musk —
esse monumento à tecnologia, ao ego e à vontade de pôr um carro no
espaço como quem pendura um quadro no hall de entrada da galáxia.
“Olhem para mim!”, gritava sem voz o conversível vermelho.
“Sou o triunfo do engenho humano, sou a máquina que venceu a gravidade, sou… ai!”
BUM.
Colisão.
O bule partiu-se em mil estilhaços
conceptuais.
O Tesla rodopiou em câmara lenta, lançando
pedaços de arrojo e pretensão para o vazio.
Do planeta Terra, milhões de olhares acompanharam o
evento.
Alguns choraram pelo carro.
Outros riram-se do
bule.
Mas poucos perceberam o que realmente se tinha passado.
🌐 A metáfora da colisão
O que colidiu naquele instante não foram dois objectos.
Foram
dois modos de ver o universo.
O Tesla: a fé cega na tecnologia, na vaidade disfarçada de avanço, na urgência de marcar território… mesmo que seja num vazio onde ninguém olha.
O Bule de Russell: a dúvida metódica, a ironia epistemológica, o direito de não acreditar sem prova — mas também de não negar só porque parece absurdo.
Mas o que é "epistemologia"?
Epistemologia é um palavrão bonito que significa, no fundo, a
ciência de pensar bem sobre o que sabemos ou achamos que sabemos.
Ou
seja, é a parte da filosofia que pergunta: "Como é que sabemos
o que dizemos que sabemos?"
Não aceita verdades porque
sim. Quer provas, métodos, dúvidas bem feitas.
E o Bule de
Russell é um exemplo genial disso: é uma forma elegante de dizer
"afirmações extraordinárias exigem provas
extraordinárias".
📀 E no fim?
No fim, nada mudou.
As estrelas continuam a brilhar.
Os
humanos continuam a discutir nos comentários do YouTube.
E
algures no vácuo, um estilhaço do bule e um espelho retrovisor do
Tesla orbitam em harmonia silenciosa.
Afinal… o cosmos é espaçoso o suficiente para acolher bule e carro, dúvida e exibicionismo, filosofia e propaganda, ceticismo britânico e arrojo californiano — mas acima de tudo,para acolher o eterno conflito entre fé e razão
. E deixa sempre uma pergunta por responder:
Afinal, o que é mais real?
Aquilo em que acreditamos, ou aquilo que conseguimos provar?
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