Se alguém se recusa a assumir responsabilidade porque “não é da sua competência”, então está a confessar que é... incompetente.
Responsáveis Incompetentes (ou o Desaparecimento
Ético em Nome da Função)
Já o escrevi antes, mas volto ao tema, porque a realidade insiste em repetir-se
Um professor de matemática não se sente responsável pelos erros
ortográficos dos seus alunos.
"Não é da minha
competência", diz, com a serenidade de quem lava as mãos como
Pilatos — mas com menos consciência do peso do gesto.
E eu pergunto:
Se não te sentes responsável… és responsável por quê?
E se achas que isso "não é contigo", devias mesmo estar ali?
Essa lógica, que se vai entranhando em muitas profissões,
espalha-se como ferrugem pelas engrenagens do serviço público — e
privado.
A fragmentação da responsabilidade tornou-se
um álibi para a incompetência moral.
E há casos em que isso custa… muito mais do que uma nota má num teste.
🏥 Vejamos o caso da saúde:
Imagine-se um doente que sai de uma cirurgia com uma sequela
permanente.
Perda de mobilidade, visão, audição. Ou um dano
neurológico.
Algo que lhe altera para sempre a forma de
viver, trabalhar, deslocar-se ou cuidar de si.
E ninguém — ninguém — lhe diz que pode, e deve, pedir um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso.
Não porque estejam proibidos.
Mas porque… "isso não
é connosco".
"É no centro de saúde."
"Fale
com a Segurança Social."
"Ah, aqui somos privados,
não tratamos disso."
🗱 O muro da não-responsabilidade
A lei, de facto, não obriga explicitamente os hospitais privados
a dar essa informação.
Mas o que se espera — ou
devia esperar — de um médico, de uma clínica, de um
hospital, não é apenas legalidade.
É
ética.
É atenção.
É informação que empodera
quem está fragilizado.
Negar esse gesto é uma forma de omissão cúmplice.
É
ver um doente sair da consulta e pensar: "o que ele fizer com o
resto da vida… já não me diz respeito."
♾ E afinal, para que serve o Atestado?
O Atestado Médico de Incapacidade Multiuso não
é só um papel.
É a porta de entrada para direitos
concretos: isenção de taxas moderadoras, benefícios
fiscais no IRS e no IVA, prioridade no acesso a apoios sociais,
estacionamento reservado, comparticipação reforçada em
medicamentos, entre outros.
Não o mencionar a quem tem direito a ele não é só omissão informativa — é privar alguém de dignidade e autonomia.
♻ Voltamos ao início:
Quem diz que não é da sua competência,
está a declarar-se
irresponsável.
E quem é irresponsável, não
devia estar a exercer.
Quer seja professor, médico, advogado ou técnico
administrativo.
Porque ser competente não é saber
apenas o que cabe no seu quadrado.
É saber o que se
passa fora dele — e ter a coragem de o dizer a quem precisa.
📌 Conclusão?
Não é preciso mudar a lei.
É preciso mudar a cultura.
A
cultura de "isso não é comigo".
A cultura da
especialização que anula a empatia.
A cultura da função que
esquece a pessoa.
E enquanto isso não mudar,
continuaremos a chamar de
"profissionais competentes" aqueles que sabem tudo…
menos
como ajudar quem os procura.
Pedro, tem toda a razão mas também é impressionante e quase assustador, ouvir pessoas com "doutoramento" e outras "competências" como por exemplo uma comentadora da Sic de seu nome Maria João Tomás " https://sicnoticias.pt/mundo/2025-05-21-video-economia-americana-a-caminho-da-recessao--51fb2f23 " que neste dia disse e repetiu que "Não se AUGURIA nada de bom!!!!!!! (Se ouvir, é lá para o meio do comentário.. ) E realmente não se augura grande coisa com este atropelo constante da nossa língua. São os influencers com um linguajar arrepiante, alguns comentadores que dizem "absteu-se", e por aí fora. Tenho verdadeiras fúrias :(
ResponderEliminarÉ verdade, Zita. Infelizmente na Televisão , que deveria ter um papel formativo, é onde se ouve as maiores barbaridades tanto em relação à lingua como à História (recente).
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